Sobre inteligência financeira na medicina e além

Sempre tive a convicção de que minha carreira médica deveria ser movida por questões que superam a prestação simples de serviços de saúde. Quando estamos de frente aos pacientes, questões superiores são requeridas. Ao longo dos anos, acatei que a nobre profissão não demanda afastamento da inteligência financeira, pois é através dela que também posso garantir uma carreira sustentável, permitindo-me oferecer contribuições mais significativas ao longo da minha jornada profissional. Simplesmente entendi o dinheiro como um meio, de fato.

 

Neste ensaio, reflito sobre a importância da educação financeira em diferentes fases da carreira médica.

 

Fase 1: Recém-egressos

Ao iniciar a carreira, muitos de nós nos deparamos com a necessidade de enfrentar as dívidas estudantis ou dívidas de compras de bens de alto preço, realizadas nos primeiros meses pós-formatura; carro é o exemplo mais frequente de dívida que a gente adquire enquanto jovem médico. Eu também fiz isso.

 

O primeiro desafio imposto pela inteligência financeira é aprender a lidar com esses compromissos de maneira organizada e responsável. Evitar o endividamento excessivo e criar um plano para sua quitação é importante, pois de outra forma, se nos deixarmos guiar pelo consumismo, isso acaba limitando a ascensão profissional.

 

Dívidas excessivas atrasam ou até mesmo impedem a especialização como entrada na residência médica, por exemplo. Nesse ponto, é crucial perceber que os recursos financeiros obtidos podem já contribuir com a elevação da sua qualidade de vida no presente ao tempo que também pode semear próximos passos para a carreira.

 

Fase 2: Especialista

Muitos alcançam o status de especialistas e passam a ter rendimentos mais elevados. Dados apontam que especialistas têm rendimento 24% mais elevados em relação aos generalistas. Nessa fase, as demandas por gastos surgem e a performance para o uso dos recursos disponíveis são mais requeridas.

 

É fundamental resistir a esse impulso de gastos desnecessários apenas pela disponibilidade do dinheiro. A inteligência financeira nos leva a refletir sobre nossas prioridades e necessidades, possibilitando que façamos um bom uso do dinheiro, desde que tenhamos objetivos a serem alcançados; seja investimentos em nossa formação contínua, formação de família nuclear própria (casamento, moradia e afins) ou estabelecer reservas monetárias para um futuro ainda impreciso no que diz respeito ao mercado.

 

Fase 3: Sênior

Na fase sênior, dois resultados podem acontecer e eu já vi isso muitas vezes. O primeiro é o alcance da estabilidade financeira. Colegas com 20 anos ou mais de carreira, conquistam honorários compatíveis com seus estilos de vida que já não demandam mais tantos gastos ou investimentos.

 

A manutenção da responsabilidade na administração sábia dos recursos permanece em uma espécie de velocidade de cruzeiro. Aqui, a estrutura da independência financeira ganha ainda mais relevância. O Faturamento Médio Mensal (FMM), nesta fase, supera confortavelmente o Gasto Médio Mensal (GMM). Trata-se de uma fase que permite a continuidade do serviço de excelência sem preocupações financeiras excessivas. Entretanto, aqueles que não plantaram a semente nas décadas anteriores, podem culminar no segundo resultado, que infelizmente, é frequente.

 

São colegas médicos seniores que se percebem com menor vigor profissional, menor capacidade de aceitar condições trabalhistas de alta pressão e que se veem em meio a necessidade de repensar e reinventar a carreira, pois da forma como têm levado a vida e suas questões financeiras, não é mais possível afastar-se do estresse cotidianos que por vezes também deixam marcas nos relacionamentos familiares e na saúde mental.

 

Fase 4: Reinvenção de carreira (por negligenciar a inteligência financeira)

Para alguns colegas da medicina, a busca por novos desafios, seja por amor ou por dor, pode levar à reinvenção de carreira ou mesmo a uma mudança completa de área. Essa fase requer uma abordagem financeira criteriosa, pois envolve riscos e incertezas.

 

A inteligência financeira nos capacita a avaliar essas oportunidades com discernimento, considerando não apenas os aspectos profissionais, mas também os impactos de tais decisões. Após décadas de medicina e tendo negligenciado as finanças pessoais, muitos precisam de um plano sólido de recuperação para quitar dívidas e construir, mesmo que tardiamente, reserva de financeiras para na sequência, e ainda com bastante disciplina e perseverança, consiga pavimentar um futuro mais próspero.

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O dinheiro como meio, não fim

A cosmovisão cristã nos lembra que nossa vida é mais do que simplesmente os anos que passamos neste mundo. Nossa visão deve se estender para a eternidade, e isso inclui como lidamos com nossos recursos financeiros. Dinheiro é um meio para alcançar objetivos, não um fim em si. Quando compreendemos isso, nossa abordagem em relação ao dinheiro torna-se equilibrada e alinhada com nossos valores.

 

Oportunidades de investimento

A inteligência financeira também nos permite identificar oportunidades de investimento que contribuem para nosso crescimento patrimonial. Alguns exemplos comuns de investimentos no mercado financeiro são: 

 

Renda Fixa: investimentos em títulos públicos ou privados com rentabilidade previsível, como Tesouro Direto e Certificados de Depósito Bancário (CDBs).

 

Renda Variável: investir em ações ou fundos de investimento que acompanham o desempenho do mercado acionário, podendo oferecer retornos mais expressivos, mas também sujeitos a maiores oscilações.

 

Fundos Imobiliários: investir em imóveis sem a necessidade de adquiri-los diretamente, recebendo renda através dos alugueis e eventual valorização das cotas.

Previdência Privada: contribuir para um plano de previdência privada pode ser uma forma de complementar a aposentadoria bem como fazer parte de um plano de organização contábil.

 

A Estrutura da Independência Financeira

São estes elementos que penso sobre inteligência financeira com visão de longo prazo:

 

Identificação de rendimentos (FMM): conhecer exatamente quanto dinheiro está entrando mensalmente é o ponto de partida.

 

Identificação do gasto mensal (GMM): analisar detalhadamente os gastos e identificar um valor médio mensal é fundamental para o planejamento financeiro.

 

Proteção de patrimônio: garantir que nossos bens estejam protegidos por meio de seguros adequados.

 

Formação de patrimônio de segurança (reserva de segurança): construir uma reserva financeira suficiente para cobrir gastos inesperados e situações de crise.

 

Formação de patrimônio de oportunidade: investir parte dos recursos disponíveis em oportunidades que podem trazer retorno e crescimento patrimonial.

 

Investimentos robustos: buscar investimentos, por vezes até mais arriscados quanto ao retorno, com vistas ao longo prazo e à construção de riqueza.

 

A inteligência financeira é uma ferramenta valiosa para o médico em todas as fases de carreira. Quando compreendemos que o dinheiro é um meio para alcançar nossos propósitos e contribuir para a sociedade, não um fim em si, podemos administrá-lo com sabedoria e responsabilidade. 

 

A educação financeira nos permite fazer escolhas conscientes em relação ao consumo, identificar oportunidades de investimentos e seguir a estrutura da independência financeira, garantindo assim uma carreira médica mais estável, produtiva e repleta de significado. 

 

Ao desenvolver essa inteligência, podemos elevar as chances de contribuir não apenas durante nosso desempenho profissional, mas também para a construção de um legado.

Dr. Daniel Coriolano - CRM 13090 RQE 7528 Médico. Mestrado Médico pela FIOCRUZ MBA em gestão, empreendedorismos e marketing PUC-RS @danielcoriolano Educação Médica Profissional: Autor do livro "Inteligência Financeira para Médicos" e "Jornada de Sucesso do Paciente" Anfitrião do maior podcast de Medicina e Mercado do Brasil, o MEDCAST

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